Bracutaia produções artísticas

Bracutaia produções artísticas - Romualdo Braga (99083034) e Wellington Cordeiro (99697840) -Produtores Culturais

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Entre cobras, marimbondos, escorpiões e jacarés há 40 anos se mantém o Bar do Bracutáia


Quem for à Gargaú, distrito de São Francisco do Itabapoana/RJ, e perguntar pelo Bar do Seu Luiz, certamente ficará sem uma resposta positiva, porém, se, ao invés disso, perguntar pelo Bar do Bracutaia terá uma resposta rápida e certeira. Isso porque Bracutaia é um personagem tradicional de Gargaú, conhecido nacionalmente. Seu Luiz de Souza Apolinário de nascimento — e Bracutáia por adoção — ficou famoso por manter uma tradição curiosa em seu bar. Ele vende cachaça com vários tipos de ingredientes em forma de conserva. Dentre uma enorme variedade, a que mais chama atenção é a de cobra. Isso mesmo. O freguês pode beber uma dose ou levar a garrafa com uma cobra dentro.

O bar, que tem mais de 40 anos, para quem visita hoje, pode parecer meio precário, mas é assim mesmo: simples como a vida de seu Luiz. Quem o visita, se encanta pelas curiosidades, além da variedade de cachaças, ele mantém pendurado no teto, duas cabeças de bezerros siameses, um sapato gigante e uma enorme cabeça de peixe. Nos fundos, um tanque de caranguejos, que é uma especialidade servida no estabelecimento.

Origem cangaceira

Bracutaia nasceu em 1924, na cidade de Olinda, sertão pernanbucano. Filho de Dimingos Apolinário, cangaceiro valente do bando de Virgulino Ferreira, o Lampião. Logo cedo se desgarrou dos pais. Aos 8 anos, juntamente com um grupo de pessoas precisou fugir da polícia pernambucana, que, na época, perseguia os cangaceiros. Inicialmente se instalou no litoral de São João da Barra, próximo a Grussaí, onde cresceu sobrevivendo da pesca. Mas tarde, casou-se com a campista Jeni Gomes Apolinário, que hoje sustenta 78 anos. Desta união, que se mantém há mais de 60 anos, nasceram 9 filhos.

Cachaça temperada

Além das cobras, marimbondos, escorpiões e jacarés são outros bichos utilizados por Bracutáia para “temperar” a bebida, como também, ervas, sementes e frutas, como carqueja, pau-pereira, coquinho do mato, pitanga, camboinha, jurubeba, jenipapo, boldo, entre tantas. Algumas misturas possuem indicações inusitadas, como a “paixão de homem”, usadas pelas mulheres para deixá-los apaixonados. As de cobra e o marimbondo são usadas para “levantar a moral” do homem. Já a “sexta-feira” serve para ajudar as mulheres a engravidar. Há, também, as que são utilizadas para fins medicinais, como a mistura que abaixa a taxa de diabete.

Seu Luiz conta que trouxe essa tradição de conservar bichos e ervas na cachaça do sertão nordestino. “Lá isso era muito comum, hoje em dia, não sei. Só sei que eu preservo isso, mas guardo o segredo do preparo a sete chaves”. Até hoje somente ele prepara as bebidas. Bracutaia alerta que é perigoso tentar fazer estas misturas, já que se lida com animais peçonhentos. É como se fosse um “segredo industrial”.

Ele garante que irá repassar essa misteriosa informação apenas para o seu filho e o escolhido foi o “Paraíba”, que é quem toma conta do bar, atualmente. “Não vou levar esse segredo comigo, essa tradição vai continuar nas mãos de meu filho. E, no momento certo, ele irá passar adiante para um de meus netos”.

Clientela famosa

Os mineiros, a maioria de Belo Horizonte, sempre foram seus maiores clientes. Mas por lá também passou muita gente famosa. Seu Luiz lembra que o ex-presidente, Juscelino Kubitschek, que era mineiro, numa visita à casa de seu amigo, Oswaldo Resende, que veraneava em Santa Clara - e que foi quem trouxe a iluminação elétrica para São Francisco do Itabapoana -, foi trazido para conhecer o bar. Bracutáia garante que JK só saiu depois de provar as cachaças com cobra e com marimbondo.

“Infelizmente não tenho uma fotografia da visita aqui no bar, mas guardo uma foto com o presidente tirada na casa do Oswaldo”. Muitos artistas também visitaram o bar, dentre eles, os atores Antônio Pitanga e Sônia Braga, quando gravavam o filme “Gabriela”. “Eles também provaram as cachaças”. Seu Luiz também lembra com saudade do amigo jornalista Winston Churchill Rangel, que era vizinho do bar e seu freqüentador assíduo. “Churchill foi criado aqui no meu bar”, conta Bracutaia.

É por toda essa história e tradição que vale a pena ir a Gargaú para uma visita ao Bar do Bracutaia, para beber uma cachaça com cobra servida no balcão pelo próprio Bracutaia, e aproveitar para trocar um “dedo de prosa” com sua figura encantadora. E, torcer para que, entre cobras, marimbondos, escorpiões e jacarés, que o bar do Bracutaia tenha vida longa, assim como seu criador.


Texto e foto: Wellington Cordeiro

* Matéria realizada em 2006 para a Revista Bussola.

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